Dámo-nos bem neste Portugal pequeno. Afinal de contas, nele, os aviões circulam, as auto-estradas prosperam e é de esperar que cresça a velocidade média dos comboios. O déficit será controlado. Vemos todos os canais de televisão. Dispomos de agências bancárias e crédito fácil em todas as esquinas. Milhares de vagas no ensino superior estão aí, para serem ocupadas. Inglês, “americanismos” e Mac Donalds q.b.. Políticos diligentes, cronistas divertidos.
Que queremos mais?
Comecemos pelo princípio. Há uma questão regional, em Portugal, com pelo menos, três factores correspondentes a dimensões essenciais que devem ser tidas em conta neste universo da globalização.
O primeiro factor, trata-se como já referi, na anterior reflexão, da existência de fortíssimas assimetrias regionais, que têm a ver com os níveis de desenvolvimento sócio/económico. Prende-se ainda com a lógica da afectação dos recursos públicos. Essas diferenças penalizam a generalidade do território português em relação à grande Lisboa. Penalizam ainda o interior face ao litoral. E grande parte do litoral em função das duas actuais áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto.
O segundo factor, resulta de um centralismo histórico na óptica do relacionamento institucional entre o Estado e todo o território continental. O máximo que vai sendo conseguido é a celebração de uma tímida desconcentração de alguns serviços da administração pública, mas, com competências e meios extremamente limitados. Ainda por cima, continuando esses serviços a assumir uma postura de obediência ao Estado, sem qualquer participação e controlo por parte das populações que supostamente servem.
O terceiro factor, está ligado, essencialmente, às questões de escala. Como se poderá constactar (e à excepção dos Governos Regionais da Madeira e dos Açores), é enorme o fosso entre os níveis de poderes democráticos que existem no nosso país, nomeadamente entre as autarquias e o Estado central.
Ora, muitos problemas de organização socio-económica e acção política exigem, do meu ponto de vista, uma escala intermédia. Digo isto, quer se trate da coordenação e gestão de um vasto leque de infra-estruturas urbanas e interurbanas (resíduos sólidos, efluentes, abastecimento de água, rede viária fundamental,...), de uma estratégia concertada de planeamento regional ou da promoção de programas de desenvolvimento integrados e territorializados. Nesta perspectiva, concordarão que para a concertação de estratégias sustentabilizáveis e sustentabilizadas, a escala nacional será demasiado longínqua e a escala municipal manifestamente insuficiente. Como consequência deste estado das coisas, ou seja, da ausência de poderes democráticos a uma escala intermédia, os organismos (como por exemplo, as comissões de coordenação) que deveriam ter uma vocação eminentemente técnica, transformam-se em organismos de poder, ainda por cima, não legitimados pelo escrutínio das populações.
E é aqui, meus caros (e por aqui), que deve entrar a discussão sobre a (re)criação das tais Áreas Metropolitanas, questão que tantas animadas e não menos “divertidas conversas” tem desencadeado.
Eventualmente favorável a uma reforma daquilo que será hoje o Estado, aquilo a que se chama o país uno e indivisível, sou, se quiserem, receptivo a uma “regionalização calma” e gradualista.
A nossa posição deve ser rigorosamente esta. Não assumindo uma posição fechada, devemos, por isso, informarmo-nos dos argumentos daqueles que questionam a oportunidade desta reforma, e aceitar muitas das suas interrogações e dúvidas. Mas só considerando argumentos. Devemo-nos recusar a fazer depender a criação de regiões e regiões/áreas metropolitanas da existência de “regiões naturais”, de “distritos naturais” ou de “áreas metropolitanas naturais”, que não se sabe o que são. Aliás, o apelo para que não haja uma suposta traição à história e à unidade nacional lembra um certo nacionalismo exacerbado que por aí anda à solta.
É nesse sentido que, no âmbito desta discussão, procuro saber quais são os argumentos dos que preferem a existência de uma comunidade urbana. Dos que preferem a criação da Área Metropolitana de Aveiro. Tento ainda verificar, até que ponto fará sentido a Área Metropolitana do Porto se não estiver associada aos municípios do Vale do Ave e da generalidade dos municípios que fazem parte do distrito de Aveiro e do Vale do Vouga. Esta última dimensão é, aliás, a que me encontro posicionado. Defendo portanto a constituição daquilo a que denomino por Grande Região/Área Metropolitana do Porto, desenvolvida entre Braga e Aveiro. Uma Região/Área Metropolitana que, sendo congregadora, pela sua dinâmica e valorização socio-económica possa capitalizar, conjuntamente com a região da Galiza, uma enorme atractividade ao nível da “velha” Europa que, necessariamente reforçará o seu relacionamento com o novo leste democrático.
É por tudo isto que importa saber o que está em causa nesta discussão da criação das Áreas Metropolitanas. Importa, acima de tudo, fazer uma análise profunda, em termos de Planeamento, de como podem ser desenvolvidas as nossa regiões, quais são as vantagens da existência de um núcleo de intervenção forte nos mais diversos domínios do quotidiano de todas as gentes da região norte (ou grande Porto).
Mas importa também questionar e saber com que meios e quais os meios. O seu financiamento. Quem gere e como gere.
É que, por muito que não consideremos as questões económicas ou financeiras fundamentais, a verdade é que, sem dinheiro, e sem um financiamento efectivo, jamais a reforma, que todos preconizam, será conseguida com a eficácia desejada.
(Novembro de 2003, in "Terras da Feira")
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