quarta-feira, 22 de agosto de 2007

(A)BALADA DAS ÁRVORES

Muitas das estradas do nosso país são caracterizadas pelas suas bordaduras de árvores de sombra, que lhes conferem um encanto especial e as distinguem das outras vias.
Quem não se recorda daquelas estradas que, numa tarde de Verão e a meio de uma viagem, conferem uma agradável sensação de frescura aliada àquela luz filtrada por esses túneis verdes. Ficam geralmente na memória as belas estradas Ribatejanas, as da zona do Buçaco ou as de algumas estâncias termais do nosso país.
Isto porque, nos últimos tempos, tem-se assistido a uma verdadeira “caça às árvores” nas bermas das estradas. E as razões, dizem, são até convincentes:
- As árvores fazem com que as estradas fiquem muito estreitas;
- As árvores antigas constituem um enorme perigo para os automobilistas e peões pela queda de folhas e ramos secos ou até mesmo das próprias árvores;
- A circulação numa estrada com árvores na berma provoca sonolência; etc...

Por outro lado, quando há zonas industriais ao longo das vias, a primeira coisa que os seus promotores fazem é uma devida terraplanagem, nivelamento do solo, e claro, arrancar todas as árvores existentes. Mesmo nos limites do terreno, em zonas onde não é permitido construir, procede-se ao abate das árvores.
Se assim não fosse, como é que seriam visíveis as imponentes instalações fabris e os grandiosos painéis publicitários ou ainda os néons de iluminação intermitente?

Quando se trata de moradias, nem pensar deixar árvores na frente! Como é que o povo poderia apreciar o esforço que o dono da casa (que em muitos casos teve influências migratórias) despendeu para construir a casa dos seus sonhos? Como é que poderia ver uma réplica da torre eiffel? Como é que poderia ver o galo de Barcelos em ponto grande? Como é que poderia ver aquelas estátuas de qualidade e desenho duvidoso? Enfim, a casa não pode ficar escondida e ensombrada pelo arvoredo.

Para finalizar, e atendendo a esta mania que alguns pseudo-profissionais da arquitectura e engenharia têm de programar as coisas, deixo-vos com esta pequena história:

- Imaginem uma região bastante conhecida pelas suas características naturais, pelo tipo de construções, pelo tipo de vivência – e que por tudo isto é procurada por muitos visitantes.
Para daí se retirarem proveitos, facilitando os acessos aos turistas, alargam-se as estradas, derrubando as árvores, surgem vias-rápidas, constróem-se grandes edifícios, desvirtua-se por vezes toda uma vivência e características de um todo...

O final da história poderia então ser este:

- No fim da rua, vai surgir um enorme shopping center, religiosamente decorado com enormes árvores e densa vegetação – em plástico, mas que até parece real – e, algumas paredes, serão apresentadas com pinturas de reconstituições perfeitas da paisagem entretanto desaparecida.
Tudo isto no interior.
E claro, com ar condicionado...
Estarei longe da verdade?

(Fevereiro de 1999)

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